Recurso interposto pela ABRADEE em face do Despacho nº 3.438/2023 é indeferido pela ANEEL

Após a publicação da Resolução Normativa nº 1.059/2023, concessionárias de distribuição do Grupo Energisa cancelaram centenas de Orçamentos de Conexão emitidos, a pretexto da suposta eliminação da inversão de fluxo de potência identificada a partir da aplicação do art. 73 da regulamentação. 

A conduta das concessionárias foi identificada pela ANEEL, vez que foram protocoladas diversas reclamações pelos consumidores na Agência. Assim, em 18/09/2023, foi emitido o Despacho nº 3.438/2023 pela STD/ANEEL, consolidando o tratamento regulatório que deve ser dado ao tema e elucidando que o cancelamento de Orçamentos de Conexão não encontra amparo na regulamentação setorial. 

Em face do Despacho em referência, a ABRADEE interpôs Recurso Administrativo, cujo teor já foi objeto de Informativo elaborado pelo CPMA, acessível por meio do link. 

Em linhas gerais, a ABRADEE argumentou a legitimidade da invalidação dos Orçamentos de Conexão, além de defender que deve ser afastada a aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos casos que envolvam a micro e a minigeração distribuída.

A Procuradoria Federal junto à ANEEL apreciou o tema, mediante o Parecer Jurídico nº 0038/2024/PFANEEL/PGF/AGU, tendo exarado o entendimento de que: 

(i) Não deve ser aplicado o Código de Defesa do Consumidor nas discussões entre minigeradores e as Distribuidoras de energia, posto que não haveria a figura do consumidor nos termos do CDC;

(ii) Não houve irregularidades nas invalidações e cancelamentos dos Orçamentos de Conexão por parte das Distribuidoras, considerando o advento da Resolução Normativa nº 1.059/2023, que determinou a realização de estudos para apurar eventual inversão de fluxo de potência e que a norma seria aplicável por se tratar de fato pendente. Desse modo, somente nos casos em que houve a (i) aprovação do Orçamento de Conexão e a (ii) celebração dos contratos entre as partes é que o cancelamento seria ilegal. 

No entanto, na 17ª Reunião Pública da ANEEL, o Diretor-Relator Ricardo Lavorato Tili proferiu Voto no sentido de indeferir o Recurso Administrativo interposto pela ABRADEE, sob os seguintes argumentos: 

(i) Aplicação do CDC aos casos envolvendo a MMGD: São aplicáveis as disposições do CDC aos casos envolvendo as Distribuidoras e os consumidores com micro e minigeração distribuída, tendo em vista que a relação de consumo está configurada quando verificada a vulnerabilidade e a hipossuficiência do consumidor. Nesse caso, verifica-se a clara assimetria de informação que leva a caracterizar a hipossuficiência e a vulnerabilidade do consumidor face a Distribuidora. 

(ii) Legitimidade da invalidação dos Orçamentos de Conexão: Não é legítima a invalidação dos Orçamentos de Conexão emitidos em nenhuma hipótese, posto que o documento é vinculante entre as partes e só pode ter seus termos alterados se houver consenso entre o consumidor e a Distribuidora, na forma o art. 83 da Resolução Normativa nº 1.000/2021; 

(iii) Aplicação retroativa das disposições da REN 1.059/2023: Não é permitida a aplicação retroativa das disposições da Resolução Normativa nº 1.059/2023 aos atos já emitidos e praticados, já que, de acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, a edição de nova lei produz efeitos para o futuro (ex nunc), respeitando-se o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada;

(iv) Ausência de análise da existência de inversão de fluxo: O Voto ponderou que, ainda que fosse legítima a invalidação dos Orçamentos de Conexão sob o pretexto da aplicação dos mecanismos de tratamento da inversão de fluxo, a conduta das Distribuidoras evidencia que, na verdade, não foi realizada análise acerca da existência de inversão de fluxo, tendo em vista que os estudos de conexão não foram emitidos.

Ademais, cabe ressaltar que os debates em mesa extrapolaram o mérito do Recurso Administrativo, tendo em vista o descumprimento das concessionárias do Grupo Energisa às determinações do Despacho nº 3.438/2023, muito embora o efeito suspensivo ao Recurso Administrativo tivesse sido negado. 

Nesse sentido, os Diretores da ANEEL recomendaram a celeridade na condução de processos fiscalizatórios em trâmite, com o objetivo de apurar eventuais condutas ilegais das Distribuidoras e aplicar as penalidades cabíveis decorrentes de atos que não encontram amparo na regulamentação da Agência.

Referência: 

Processo administrativo nº 48500.005218/2020-06

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