TCU inicia processo fiscalizatório para apurar venda de energia em geração compartilhada de GD

Em 05/03/2024, o Tribunal de Contas da União (TCU) acolheu representação formulada pela Unidade de Auditoria Especializada em Energia Elétrica e Nuclear – AudElétrica no sentido de apurar condutas indiciárias do setor de micro e minigeração distribuída (“MMGD”) em relação à eventual comercialização ilegal de créditos de energia elétrica, o que viria a contrariar o marco legal da matéria.

De acordo com a exposição de motivos adotada no Processo TC 005.710/2024-3, o art. 28 da Lei 14.300/2022 preconiza que a geração proveniente de GD é caracterizada como produção de energia para consumo próprio, de modo que não poderia haver arranjos negociais e/ou empresariais que visem à comercialização, direta ou indireta, dos créditos de energia elétrica.

Para mais, a despeito do art. 10 da Lei 14.300/2022 vedar o aluguel e/ou o arrendamento de terrenos nos quais a GD está instalada em condições nas quais o valor do aluguel e/ou do arrendamento se dê em real por unidade de energia elétrica, foram identificados pela AudElétrica casos que contrariavam o dispositivo normativo.

Entretanto, a AudElétrica averiguou que, apesar de a Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL ter aberto a Tomada de Subsídios nº 18/2023, com vistas a receber contribuições do setor acerca dos mecanismos de comercialização de energia no bojo do Sistema de Compensação de Créditos de Energia Elétrica – SCEE, o processo regulatório da Agência não teve sequência, inexistindo parâmetros normativos fixados para fiscalização do tema até o presente momento.

Em alegação à competência para fiscalizar a implementação de políticas públicas vinculadas a subsídios tarifários, o TCU recebeu a representação da AudElétrica com o objetivo de aprofundar a instrução sobre os achados preliminares da Unidade de Auditoria, bem como para investigar a efetiva prática da venda de energia através de empreendimentos de MMGD, que distorceria o mecanismo do SCEE.

Modelos de geração compartilhada investigados

Para fins elucidativos, a fundamentação do TCU para o acolhimento da representação realizada pela AudElétrica foi respaldada nos seguintes casos concretos:

1) Assinatura de energia com desconto garantido: A partir da adesão ao veículo de geração compartilhada via assinatura de energia, o consumidor adquire créditos de energia elétrica, os quais correspondem a um desconto percentual garantido na fatura de energia elétrica do consumidor.

Em alguns casos, foi relatada a indexação da remuneração dos contratos de adesão aos veículos de geração compartilhada à tarifa de energia homologada para a Distribuidora local.

2) Conduta anticoncorrencial de Distribuidoras cujo grupo empresarial possui segmento de atuação em MMGD: Houve a identificação de casos em que empresas vinculadas a grupos empresariais que atuam no segmento de concessão e/ou permissão de distribuição de energia elétrica fornecem o serviço de assinatura de energia elétrica para fruição dos benefícios de MMGD para os consumidores.

Na óptica apresentada, haveria conflito de interesses entre as atividades desenvolvidas pelo grupo empresarial, bem como poderia restar configurada espécie de autocontrato, passível de anulação pela legislação pátria.

3) Locação de central de micro e/ou minigeração distribuída: Apresenta-se como problemática a rentabilização das centrais de micro e/ou minigeração mediante o pagamento de aluguel.

Nos termos apresentados pelo TCU, o aluguel de usinas se aproximaria da compra e venda de energia. Entretanto, na ponderação do TCU, a atividade deveria ser outorgada a Produtores Independentes de Energia (PIE), os quais podem contratar com consumidores livres ou especiais, não havendo autorização legal para contratar com consumidores cativos e/ou residenciais.

Determinações do Despacho do TCU 

Após o recebimento da representação da AudElétrica, através de Despacho exarado em 13/03/2024, o TCU requereu a manifestação da ANEEL no prazo de 15 (quinze) dias com o objetivo de que a Agência se posicionasse sobre as irregularidades identificadas no mercado de MMGD pela AudElétrica e sobre a possibilidade da promoção de melhorias na regulamentação e/ou fiscalização do tema nos seguintes termos:

1.  Elaboração pela ANEEL, no prazo de 60 dias, de plano de fiscalização para identificação e fiscalização de mecanismos de comercialização de créditos de energia elétrica;

2.  Inclusão no plano de fiscalização de medida acautelatória com o objetivo de impedir o registro de novos empreendimentos de MMGD até que a ANEEL proceda com a implementação da regulamentação do tema;

3.  Elaboração pela ANEEL, no prazo de 80 dias, de plano para regulamentação do tema, com o objetivo de coibir a comercialização, direta ou indireta, de créditos de energia no SCEE em MMGD;

4.  Inclusão no plano de regulamentação de estudos de impacto para correção das irregularidades nas autorizações ao funcionamento de empreendimentos já conferidos, em observância ao art. 20 da LINDB.

Além disso, o Despacho do TCU autorizou que a AudElétrica desse prosseguimento à instrução probatória no sentido de coletar informações e dados de mercado com o objetivo de corroborar os cenários de irregularidade informados na representação da Unidade de Auditoria.

Possibilidade de manifestação das associações do setor elétrico 

De acordo com o art. 146 do Regimento Interno do TCU, é possível a habilitação de interessado em processo administrativo mediante a apresentação de pedido de ingresso formulado pelo interessado e devidamente fundamentado com as razões que lhe assistem o interesse processual.

Nos termos do §2º do art. 144 da normativa, o interessado se qualifica como aquele que “em qualquer etapa do processo tenha reconhecida, pelo relator ou pelo Tribunal, razão legítima para intervir no processo“.

Nesse sentido, faz-se necessário destacar que as associações do setor elétrico podem requerer a habilitação no processo em questão, com o objetivo de se manifestar sobre a representação formulada pela AudElétrica e apresentar documentos que possam corroborar a formação do convencimento do TCU.

Frise-se, por fim, que o requerimento de habilitação não precisa ser necessariamente formulado dentro do prazo de 15 (quinze) dias concedido para a manifestação da ANEEL via mencionado Despacho do TCU.

 

Referências: 
Processo TC 005.710/2024-3

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